domingo, 16 de dezembro de 2007

A Triste Saga do Monroe

Interessante seria que as informações deste relato fossem objeto de séria matéria jornalística, para elucidar a verdadeira razão da demolição do Palácio Monroe e o destino das obras de artes que ali existiam. Vejam as fotos do Palácio Monroe, nos site abaixo e, depois, leiam o texto:

Fotos Nadia

A Triste Saga do Monroe

Ao contrário do que se pensa, Palácio Monroe não foi demolido por causa do Metrô Por Roberto Tumminelli (1)

O Palácio Monroe era um marco visual na entrada do Centro do Rio. Até hoje a história da criminosa demolição do Palácio Monroe é cercada por uma lenda. Por meio desta breve crônica, vou expor o histórico e a verdadeira causa de sua demolição. Você verá como uma história fantasiosa perdura por muitos anos entre os cariocas encobrindo um dos maiores crimes contra a história do Rio de Janeiro e do Brasil.

O Palácio Monroe foi construído originalmente nos Estados Unidos pelo governo brasileiro, que participava das comemorações do centenário de aniversário de integração do Estado de Louisiana (EUA). A arquitetura do Monroe causou impacto perante a todos os presentes à comemoração. A imprensa americana chegou a ressaltar seu estilo e suas linhas. Por fim, foi merecedor do prêmio de melhor arquitetura da época: o Grande Prêmio Medalha de Ouro. Seu projetista foi o Coronel Arquiteto Francisco Marcelino de Souza Aguiar. Sua estrutura, toda metálica, permitiu que fosse desmontado e depois remontado em solo brasileiro.

O Palácio foi reerguido no fim da Rua do Passeio onde havia um velho casario.

Em estilo eclético, marcou pelo rompimento do uso da arquitetura portuguesa no Brasil.

O Monroe foi entregue aos cariocas e ao Brasil em 1906 por ocasião da Terceira Conferencia Pan Americana, sediada nele. Durante a abertura da Conferência, o mestre de cerimônias, Barão do Rio Banco, batizou o então Pavilhão Brasil de Palácio Monroe, uma homenagem ao presidente norte americano James Monroe, idealizador do Pan Americanismo.

Além dessa conferência, o Monroe foi palco de vários eventos, tais como 'o 4º Congresso Médico latino Americano e o Congresso Internacional de Jurisconsultos.

O edifício foi sede também do Ministério da Viação e, em 1925, foi transformado em sede do Senado Federal. Após a inauguração e transferência da capital federal do Rio para Brasília, o Monroe deixou de abrigar o Senado Federal e passou a sediar o Estado Maior das Forças Armadas.

Em 1964, os militares derrubaram o então presidente da República, João Goulart, e tomaram o poder, transformando o Brasil numa ditadura. Com isso, o atestado de óbito do Monroe estava começando a ser assinado. O requinte apresentado no interior do edifício: balaustrada de mármore e lustres de cristal

O Metrô chega à cidade

Com a vinda do metrô, foi projetado um desvio que 'passaria ao lado do Monroe, para evitar sua demolição. O desvio chegou a 'ser iniciado. O sonho de haver um sistema metroviário no Rio é antigo, porém só em 1966 se abriu uma frente de estudos para a inicialização da viabilidade das obras.

A Companhia do Metropolitano do Rio de Janeiro foi criada em 1968.

O primeiro canteiro de obras se deu na Glória em 1970, mas as obras ficaram paralisadas entre 1971 e 1974. Em 1975, as obras foram retomadas e seguiram em direção ao Centro da Cidade. A estação seguinte à da Glória seria a Cinelândia.

No 'meio do traçado dos trilhos estava o Palácio Monroe. O que fazer com ele?

O intuito do Metrô sempre foi preservar prédios de importância histórica que estivessem próximos ao traçado dos trilhos, como o Teatro Municipal e 'a Câmara de Vereadores, mas o Monroe estava bem no meio do traçado. A solução foi fazer uma modificação no desenho original da linha. Um desvio que passaria ao lado do Monroe, para que fosse poupada a sua demolição.

Decidida essa etapa e estudada a obra, pôs-se em pratica a construção do desvio. Por causa do terreno e da proximidade das fundações do Monroe foi empregada uma moderna tecnologia para que tudo corresse bem. O escoramento do terreno foi feito com cuidado para que não houvesse perigo dele ceder e por em risco o Monroe. As fundações do Palácio eram verificadas duas vezes ao dia.

As obras continuavam e o tombamento do Monroe (pedido em 1970) não saía. No entanto, continuava a batalha para a sua preservação. A escadaria de mármore da entrada do Palácio foi desmontada por uma equipe de técnicos vinda especialmente da Itália e guardada no interior do Palácio. A retirada da escada era necessária, pois coincidia com as paredes da vala a ser aberta.

A escavação da vala, colocação das contenções necessárias, entre outras medidas, resultaram no sucesso da operação e, no final, o Palácio não havia sido abalado em nada.

A feitura de tal empreitada e seu sucesso foram alvo de matérias em revistas especializadas.

Da parte do Metrô o Monroe estava salvo. No entanto, aproveitando-se da sua obra, o então Presidente da República, Ernesto Geisel, autorizou o Patrimônio da União a providenciar sua demolição em 1976.

A obra e os esforços haviam sido em vão para a frustração e tristeza daqueles que preservaram o Monroe e que tiveram um exaustivo trabalho que foi completamente ignorado e também para a tristeza de muitos cariocas que viram ruir um pedaço da história da cidade e do Brasil.

Trabalho esse que é ignorado por muitos cariocas e inclusive jornalistas, que no mínimo deveriam ter a obrigação de saber que o Monroe foi poupado pelo progresso, mas que continuam insistindo em publicar a historia que o Metrô foi o culpado pela demolição do Palácio.

Enquanto o Metrô desviava o trajeto da linha para poupar o Palácio Monroe de sua demolição, três figuras muito conhecidas dos brasileiro pediam ferrenhamente a sua demolição.

Eis seus nomes:

General Ernesto Geisel: Quarto presidente militar desde o Golpe de 64. Empossado pelo Colégio Eleitoral em 1974. Nutria um ferrenho horror pelo filho do Coronel Arquiteto Francisco Marcelino de Souza Aguiar, projetista do Palácio Monroe. A raiva que Geisel sentia dele foi originada quando o filho de Souza Aguiar foi promovido no Exército em detrimento de Geisel. Por puro ódio e vingança, Geisel aproveitou seu poder de Presidente da República e simplesmente autorizou a demolição do Monroe, acabando com o premiado projeto do pai de seu inimigo. O Monroe começa a ser demolido em janeiro de 1976.

Roberto Marinho: Jornalista. Chefe das Organizações Globo. É de conhecimento público o apoio dado por Marinho aos militares desde a época do Golpe. Aproveitando a grande circulação do Jornal O Globo, fez uma enorme campanha a favor da demolição do Monroe aproveitando-se da obra do Metrô. Quase que diariamente O Globo publicava editoriais exigindo o desaparecimento do Palácio. Fica claro que esse apoio aos militares visava sempre ter os benefícios que o governo federal podia proporcionar.

No último editorial publicado pelo Globo podia-se ler as seguintes palavras:

"Por decisão do Presidente da Republica, o Patrimônio da União já está autorizado a providenciar a demolição do Palácio Monroe. Foi, portanto, vitoriosa a campanha desse jornal que há muito se empenhava no desaparecimento do monstrengo arquitetônico da Cinelândia. (...) O Monroe não tinha qualquer função e sua sobrevivência era condenada por todas as regras de urbanismo e de estética. Em seu lugar o Rio ganhará mais uma praça. Que essa boa noticia que coincide com o fim das obras de superfície do metrô da Cinelândia seja mais um estimulo à remodelação de toda essa área de presença tão marcante na historia do Rio de Janeiro".

Lúcio Costa: Arquiteto.

Defendia também a demolição do Monroe.

Costa defendia ferrenhamente a demolição de qualquer prédio que não apresentasse o modernismo brasileiro (de que ele foi expoente). Qualquer outro estilo se dependesse dele, seria alvo das marretas. Não importasse o estilo, art noveau, art decó, eclético. Para ele só deveriam ser preservados o colonial, o barroco português e o modernismo.

Costa chegou ao cúmulo de passar abaixo-assinados em associações de arquitetos para endossar a demolição do Monroe. Foi mal visto na época por seus colegas que nunca o perdoaram por esse gesto criminoso.

Os outros dois personagens citados acima aproveitaram dessa opinião de Costa e puseram em frente à operação de demolição do Monroe, sob a capa da legalidade.

Do lado oposto à demolição estavam arquitetos, o CREA, o Jornal do Brasil, o Juiz Federal Dr. Evandro Gueiros Leite (que sugeriu que o Monroe sediasse o Tribunal Federal de Recursos, que estava sem sede), o Serviço Nacional do Teatro, a Fundação Estadual dos Museus, a Secretaria Estadual de Educação, e várias outros entidades importantes e principalmente o povo carioca.

A Demolição

Os famosos leões de mármore foram levados para o Instituto Ricardo Brennand em Recife.

Depois de aprovada pelo Presidente General Ernesto Geisel, a demolição do premiado Palácio começou entre janeiro e março de 1976. Aos poucos, um importante pedaço da história de nosso país começava a virar pó, pedra e escombros.

A empresa que foi contratada para demolir o Monroe pagou apenas CR$ 191 Mil (cento e noventa e um mil cruzeiros) com direito de venda de todo o material. Com a venda do bronze e ferro do Monroe ela faturou CR$ 9 Milhões. Tudo foi vendido: vitrais, lustres de cristal, pinturas valiosas, estátuas de mármore de Carrara e bronze, móveis em jacarandá a balaustrada de mármore. Havia uma escada de ferro em caracol que foi vendida pela pechincha de CR$ 5, 00 (cinco cruzeiros), o metro. Sem contar muitas outras peças.

Grande parte do piso, com mais de 2000 metros quadrados, foi para o Japão. Tudo por causa do tipo de madeira: peroba do campo. Seis dos dezoito anjos de bronze foram parar na fazenda de Luiz Carlos Branco em Uberaba, além de alguns balcões de mármore e vitrais. Os leões que ficavam na escadaria na entrada do Monroe hoje estão no Instituto Ricardo Brennand em Recife, Pernambuco.

Terminada a demolição o terreno ficou vazio. As obras da Estação Cinelândia do Metrô continuavam. A partir daí, o Metrô tornou-se, erroneamente, o grande vilão de toda essa historia. E até hoje grande parte dos cariocas atribui a ele a demolição do Monroe. Cabe a nós fazer um trabalho de formiga e divulgar entre todos que conhecemos a verdadeira historia do fim do Palácio Monroe.

Os algozes do Monroe ficaram felizes e com certeza dormiram tranqüilamente pouco se importando com o ocorrido e com as pessoas que tentavam salvar o Palácio.

O Monroe não existia mais. Em seu lugar surgiu uma praça. Nela hoje está um belo chafariz que foi originalmente posto na Praça XV. Depois passou para a Praça Onze e terminou no lugar do Monroe pouco tempo depois da sua demolição. Chafariz belíssimo comprado na Áustria pelo Governo Imperial em 1878. Em homenagem ao Palácio é chamado de Chafariz do Monroe.

O atual Prefeito do Rio, Cesar Maia, lançou a idéia de reconstrução do Monroe. Ficou engavetada. Em 2002, durante a construção do estacionamento subterrâneo que se localiza debaixo da praça onde ele ficava operários encontraram uma caixa metálica contendo vários objetos relativos à construção do Monroe, entre esses objetos estavam uma pedra do Palácio e uma edição especial do Jornal do Brasil. Esse material foi entregue à Biblioteca Nacional. Esse foi o triste fim do Palácio Monroe. Destruído única e exclusivamente pelo sentimento de ódio e vingança de um homem, apoiado pela mídia mafiosa e manipuladora e pela idéia tresloucada de que o Monroe devia desaparecer por não ser um representante da arquitetura brasileira. O respeito pela história de um país, pelo esforço de quem o projetou do suor dos operários que o construíram e pelos apelos de inúmeras pessoas sensatas não foi sequer considerado.

Três homens puderam, pelo poder (mesmo que temporário), pisotear tudo e todos. O que resta agora são fotos, memórias, lembranças e lágrimas.

O vazio deixado pela demolição do Monroe

Então, toda vez que você estiver chegando ou saindo da Estação Cinelândia (em direção à Zona Sul) preste atenção na ligeira curva que o trem faz e lembre-se dessa frase publicada num manifesto contra a demolição: “... restará aos usuários do Metrô perceberem que, onde foi o Monroe, haverá uma misteriosa curva..."

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